sábado, 27 de dezembro de 2008

Uma pausa

Chocolate meio amargo
Vinho, tinto
Pão
Azeite
Azeitona
Cereja fresca
Queijo
Cama
Filmes, muitos
Cheiros
Sossego
Livros
Café recém coado
Roupa de cama limpa
Casa arrumada
Eu...

domingo, 21 de dezembro de 2008

"Quando o dedo aponta o céu,
o imbecil olha o dedo"

terça-feira, 16 de dezembro de 2008

Penso solto, penso...

Mais medos...
Ansiedade...
Misturado com a alegria.
E com meus vários fins,
Descubro sempre e
Sei, tão certo que até duvido,
Que tudo, tudo vai dar certo

sábado, 13 de dezembro de 2008

Memórias

Balas Bandinha,
Minha vó remexendo
Doce no fogão de lenha,
De casca de laranja,
De mamão, manga com côco,
Meu avô na porta da casa.
Pão quentinho com manteiga
Café todas as tardes.
O ônibus da escola,
Piscina de plástico.
Domingo de missa,
Banco imobiliário,
Água de filtro de barro,
Feijão com toucinho.
Garagem para brincar,
Canudo de doce de leite,
Arroz-doce, canela e raspa de limão,
Guarda-chuva de chocolate,
Chiclete adams,
Um cheiro de saudade...

terça-feira, 2 de dezembro de 2008

Do que não quer ver

Existo, ainda que
Seu não-olhar
Negue a concretude
De minha vida-existência
Aqui, bem diante de você.
E estarei por perto,
Agora e por muitos,
Longos tempos...
Re-Existo.

segunda-feira, 1 de dezembro de 2008

Ao novo!!!

Dezembro especial para mim o que se inicia. Mais ou menos equivalente a um ano novo antecipado. Cheio de novidades, muito aprendizado, e claro, muito a descobrir, eu testando os meus limites. Medo, muito medo, ansiedade, mas ao contrário dos últimos meses, agora é a expectativa da nova vida, o medo e ansiedade que motivam. Coragem nunca faltou para o desconhecido, mesmo quando eu nem enxergava direito o caminho por onde seguia. Diferente agora sou eu, e tomara que isso seja o melhor.
Te acolho, receosa ainda, e sei que logo partilharemos muita coisa boa. Bem-vinda!!

sábado, 29 de novembro de 2008

Da expectativa

A dois dias de quase tudo, tudo é expectativa. Vou mergulhar novamente em um universo que teoricamente domino, mas meu olhar tudo estranha nesse movimento que agora se tornou novo, já que não se realizava há muito. Sei, mais uma vez, que só o tempo vai tornar confortável esse vôo, como acontece com tudo nessa vida. Vou passar os próximos dois dias tentando segurar meus pensamentos, assim não irão tão longe, se perdendo de mim. Mais uma vez, ganhei um mundo novo e perdi várias possibilidades. Ainda que longe de ser conformismo, me vem à cabeça: não se pode, mesmo, ter tudo. Paciência...

quarta-feira, 26 de novembro de 2008

Um viva!!

Uma Uda!!
Adorei colocar em dia a conversa. Apesar da distância no tempo e espaço, ainda temos muito em comum, e conseguimos rir juntas!!! Um viva, com vinho, como sempre!!!!!!! Outro viva às lembranças das zoropa!! Mais um viva pra quem vive a vida assim!!! Viva 2008, que foi sensacional pra nois!!!!! Viva!! Beijos!!!

segunda-feira, 24 de novembro de 2008

Pensamento soltos

Depois de tudo
Depois de tanto,
Descubro:
A espera
Valeu a pena

sexta-feira, 21 de novembro de 2008

Espero, espero
...
...
...
...
...
Bem-vinda!!

terça-feira, 18 de novembro de 2008

A outra

Minha porção cínica, digamos assim, é a que me mantém alerta. Cinismo soa pesado, dito de tal maneira. Digamos então: minha porção descrente. Ela me avisa dos perigos, reais e imaginários, de tudo que pode dar errado, do mau tempo que pode vir no meio de um passeio ensolarado, estragando tudo. Ela me deixa de prontidão para o acidente que pode acontecer, para a pele ruim em dia de comemoração, para a briga que pode rolar no melhor da festa, para os males que podem estar em qualquer parte. Ela é responsável por todos os receios antecipados, ansiedade nauseante, taquicardias e insônias que por vezes assombram. Dela vêm os medos mais profundos, superdimensionados por mim, eu que ando de mãos dadas com minha imaginação fértil. Eu a escuto, só escolhi não dizer tanto dela, tento não dar cartaz, e assim evito (?) que se torne a realidade que não precisa ser. Ela, a cínica, descrente, tem sempre palpites, para todo tipo de assunto. Olho bem pro fundo: ainda está aqui. Não me queixo, ela cumpre seu papel. Por fim, vejo: a outra é maior ainda.

segunda-feira, 17 de novembro de 2008

Sou?

Eu, que me cato
Em pensamentos
Próprios
E mesmo os alheios.
Escuto aquilo
Que nem quero
Penso e
Falo
Às vezes
O que não devia.
Continuo,
Sempre e apesar de.

segunda-feira, 10 de novembro de 2008

Outras palavras

Canção de nós dois

Tudo quanto na vida eu tiver

Tudo quanto de bom eu fizer
Será de nós dois
Será de nós dois

Uma casa num alto qualquer
Com um jardim e um pomar se couber
Será de nós dois
Será de nós dois

E depois, quando a gente quiser
Passear, ir pra onde entender
Não importa onde a gente estiver
Estaremos a sós

E depois, quando a gente voltar
O menino que a gente encontrar
Será de nós dois
Será de nós dois

E de noite quando ele dormir
O silêncio do tempo a fugir
Será de nós dois
Será de nós dois

E por fim, quando o tempo fugir
E a saudade nos der de nós dois
E a vontade vier de dormir
Sem ter mais depois

Dormiremos sem medo nenhum
Pois aonde puder dormir um
Podem dormir dois
Podem dormir dois
Podem dormir dois

Vinícius de Moraes

Espaço na memória...

Pronto, agora deu-se o seguinte: eu, que não ando lá muito inspirada para textos do blog, estou esquecendo sobre o que escrever... Explico: em meio a outras atividades, vem à cabeça o tema para um post, e eu consigo desenvolver em segundos o texto todo, com lógica, poesia, princípio, meio e fim, mas não me dou o trabalho de anotar. E confio nessa memória, que anda insistindo em me enganar. O fato é que, passado pouco tempo, não tenho a menor pista do que ia escrever. Envelhecer tem disso. Tem muita coisa boa, é verdade, mas a cabeça não é a mesma... E olha que não me faltam bloquinhos, papéis, cadernos para escrever uma linhazinha que seja, a fim de lembrar o que fazer. Assim, nada de interessante para postar hoje.

sexta-feira, 7 de novembro de 2008

Reputação?!?

Meu namorado acha que tenho mania de limpeza. O engraçado é que tenho a fama, entre família e conhecidos, de ser uma bagunceira inveterada. Minha irmã, quando me ouve dizer que estou limpando a casa, diz que é milagre. Confesso que não morro de amores pela rotina doméstica de limpar. Houve um tempo em que as pessoas gostavam de estar em minha casa justamente pelo meu descompromisso com a ordem e etc, isso as fazia se sentir à vontade. É isso: em um segundo, uma reputação duramente construída, ao longo de anos, se desfaz...

quarta-feira, 5 de novembro de 2008

segunda-feira, 3 de novembro de 2008

Sem título - Um dedo de poesia

Era um dia
Como outro qualquer, aquele.
E espreitando,
O tão bem-vindo
(In)Esperado.

quinta-feira, 23 de outubro de 2008

sábado, 18 de outubro de 2008

Post it

Porque o dia passa rápido, quando temos muito que fazer. Porque ele também passa devagar, quando temos pés e mãos atados. Porque tem a falta de paciência, somos humanos, porque tem a TPM, somos mulheres. Porque existe o tédio, a depressão, alegria e tristezas inesgotáveis. Porque tem a imperfeição, sempre. E por tudo que existe, tem também o perfeito. O perfeito do sentir. Porque acontece, e às vezes eu sou cega para a presença ao meu lado, eu que tanto quis. E por tudo isso, para que eu nunca esqueça o que sinto por você.

sexta-feira, 17 de outubro de 2008

Lógica

Então que hoje
Deixei a casa
Toda brilhando
Como um brinco
E feliz, fui
Inventei de cozinhar
Uma torta,
Isso mesmo,
Assim mais ou menos
Foi o que me saiu.
Nem tudo
Sai como eu quero.

quinta-feira, 16 de outubro de 2008

(Re) Fluxo

Não sei... O papel me olha, em branco, e não sei o que dizer. Há uma enxurrada de pensamentos querendo sair, um fluxo incontrolável, pensamentos que se atropelam. Estou no caminho que escolhi, e sei que assim: renúncias várias. Aceito a condição. Mas dói... Dói como há muito não doía, como não doía nem mesmo quando deixava uma vida para trás, dói fundo e lágrimas nas quais nem acreditava mais, muitas, dói que nem sei se posso mais olhar para você, dói e nem mesmo sei por que, pois não há nada a que me apegar. E, no entanto, dói... Mas doer assim agora me lembra: passa. Passa e um dia nem me lembrarei que chorei por minhas escolhas, não sei nem mesmo se lembrarei de você. E estarei novamente feliz e novamente chorando pelas escolhas que virão.

Outras luzes, outros dias. Noites iluminadas, brilhantes, escuras, dias frios, úmidos, quentes, vibrantes, encantadores e desenganadores. Certo, em meio a tantas possibilidades, é somente a idéia de que sobreviverei. Seja qual for a tempestade, sobreviverei. Porque tristeza e alegria dão fibra, fazem rijos os mais fracos e testam a alma de quem os experimenta. A medida de minha dor me dá a imensidão da minha capacidade de ser feliz. Então sigo, mas humana que sou, peço um pouquinho a mão de Deus na minha, para sentir que não estou inteiramente só.
08.01.2006

segunda-feira, 13 de outubro de 2008

quarta-feira, 8 de outubro de 2008

Possível

Caminhava por onde já se conhecia, uma tarde abafada, calorenta, uma chuva necessária se anunciava... em vão. Lembrou que há muito não via os mensageiros, vai que não tinham notícias. Já haviam anunciado? Sua capacidade de surpreender (se) não se esgotava, e observou admirada, num relance, as flores lilases bonitas que dava a árvore, mesmo podada, quase morta. Na impossibilidade de um registro fotográfico, tratou de fixar a imagem no cérebro, o bonito lilás, profuso. O caminho tinha árvores outras, e ainda surpresa, viu: flores amarelas, e pequenas, em plena morte, caídas, no chão. Ainda ali, podia-se ver a beleza delas, possível ainda na agonia. Faziam-se tapete, pequenos pontos dourados, todos juntos, cobrindo o frio feio do asfalto. Podia ter poesia, o concreto. Aquele nem era o caminho mais bonito, entretanto guardava surpresas como essas. Assim era: escolhera, sem saber ao certo, um destino, e o cumpria com a convicção de que era a sua construção possível.

Música!

sábado, 4 de outubro de 2008

Bonito

Acho bonito quando ele chega, com uma sacola na mão, cheia de frutinhas colhidas no quintal de casa. Faz graça, esconde, porque eu, curiosa, mal o cumprimento e fico olhando para a sacolinha, querendo saber se é pra mim. São pra mim, e hoje comi um monte de amora fresca: um monte de uma vez, tem mais gosto assim, ele me ensina. Acho que vi em algum lugar que russos adoçam seu chá com framboesa ou amora, sei lá. Achei poético. Foi Clarice quem disse que achar bonito é um jeito indireto de entender? Ainda tenho algumas poucas amoras, acerolas, pitangas. Tudo é um jeito de dar mais sabor à vida. Acho bonito demais.
Foto por Alexandre, que as faz e me traz para mostrar coisas bonitas

quinta-feira, 2 de outubro de 2008

Grandes expectativas – 2

Ops! Menos de uma semana para o meu aniversário. E ainda acho graça em comemorar, adoro!!! Cantar parabéns, vela, bater palmas, e viva eu. Me sinto criança. A verdade é que nada muda de um dia para o outro, a cabeça e o corpo se alteram mesmo é com o passar de cada dia, mas assim como no ano novo, fazer aniversário deixa a sensação de que um novo tempo se inaugura, mesmo que só na cabeça de cada um. E é também o fim do inferno astral, que não sei se existe mesmo, mas na dúvida...
Aproveito para renovar minha confiança e otimismo, a fé em mim e nos outros, e continuo crendo que os dias serão melhores, mesmo com alguns surtos a que estamos sujeitos no percurso. Continuo sujeita às crises, ataques de pessimismo, tristeza, etc, mas uma olhada no retrovisor me faz ver que aprendi muitas coisas boas no último ano... Balzaquiana! Ah, se eu soubesse que era bom assim...


*Foto do aniversário de 2006

Grandes expectativas

Desconectar... Resistindo à tentação de adentrar a madrugada navegando, desliguei o computador. A TV muda. Celular, off também. E pensei em tirar da tomada o sobrevivente, o fixo. Tantas acessos, eu que não quero agora ser encontrada. Pelo menos durante algumas horas, o sossego de não ser chamada para nada, por ninguém. Eu cortei todas as possibilidades. Pelo menos por um tempo, tenho a certeza de que N A D A vai acontecer. Não esperar nada, expectativa nenhuma, livre... esperar é que gera desilusão? Música pode, e só isso me lembra que o mundo/tempo lá fora ainda (r)existe.

quarta-feira, 1 de outubro de 2008

Saco

Já teve um dia de merda? Claro, ninguém passa ileso... Mas tanta frustração que você se pega imaginando o que falta acontecer. Melhor nem pensar, vai que acontece, visto que ainda falta muito para a meia-noite. Queria escrever, sem saco,,,

terça-feira, 30 de setembro de 2008

Identidade - outra face

Um inferno astral antecipado, e agora quase no final, pelo menos é o que espero. Percebi hoje que tenho o tempo contado, então aproveito os segundos finais do descanso que me resta. Nunca mais deixarei um abraço para depois, gosto deles, e assim fiz ontem um chamado para um abraço de despedida. Não para tempos de longas ausências, visto que nos veremos daqui a pouco, mas nunca mais ficará para depois um abraço, um beijo, um carinho. Meu gostar é também pelo toque.
Meu corpo quer descanso, mas meus pensamentos não dão trégua, e tenho que tentar uma tradução. Eles me governam, eis minha conclusão. Gostaria de contar histórias, tenho muitas e posso inventar outras tantas, imaginação não me falta. Tenho um baú de memórias, e gavetas abarrotadas de lembranças.
Tenho medos calados e alegrias escandalosas, e insisto em continuar dando voz e “corpo” aos meus sonhos todos. Anoto no meu caderno roxo, dou vida a eles, ainda que uma vida de papel (melhor que não existir nunca). Descubro a cada dia que ter um mundo de amigos faz daqui realmente um lugar melhor, obrigada a todos vocês que trazem um pouco de esperança. Olho em volta, vejo o deserto, mas tenho a impressão de divisar algo parecido com um oásis. Sou um misto de dor, vergonha, esperança, e muitas, poucas certezas. Uma delas é a de que o fim da estrada não é aqui.

sexta-feira, 26 de setembro de 2008

Identidade

A vela que insiste com sua chama inquieta, e me atormenta os pensamentos. A chuva, que não dá mais trégua, e o senso comum diz que é primavera. Imagino se as estações se rebelaram com a loucura do mundo e agora se comportam como bem entendem. Reminiscências vãs. Ninguém responde às minhas perguntas. Questionamentos demais, cobranças demais, dúvidas demais.

Faz frio, e por mim, assim é melhor, me sinto ainda mais acolhida no refúgio, lugar de repouso que criei, e onde me escondo de tudo quando quero. Exercito os pensamentos escrevendo coisas que ninguém lê, me acalmam e basta isso. Penso naqueles por quem peço, nem sempre consigo atender quando precisam, eu que nem de mim escuto os sinais. Eu agora habito o silêncio das madrugadas frias, e inauguro a estação gelada das flores, a quem recebo de braços cobertos. Tenho pensamentos-turbilhão, que me mantêm insone, e nada em mim nasce pronto, tudo é meio sem sentido. Ainda consigo ver graça em algumas cores, reparo que gosto particularmente de uma delas. Faço planos de conhecer o mundo e penso às vezes que mal conheço minha cidade. Já quis ficar por aqui eternamente, mas penso hoje que pode ser tempo demais. Apaixono-me por músicas, sem saber o que dizem suas letras, agora tenho ouvido musical. Aprendi a cantar e dançar sozinha, e posso fazê-lo também em boa companhia. Não tenho certeza sobre o que quero, mas tenho alguns nãos na ponta da língua. Aqui é onde mora o incerto. Disciplinar pensamentos é tarefa ingrata. E ao final, eu sou apenas o outro ponto de vista de mim mesma.

Refúgio

Eu quero ir prá roça
Andar pela estrada de terra,
Ver as vacas recém-ordenhadas,
Ver carro de boi, fogão a lenha,
Comer milho assado na brasa.

Quero meus primos todos juntos
Contando causo de lobisomem
Aparição e alma penada,
História pra criança assustar.
Quero meu vô e minha vó
Luz de lamparina, querosene.
Cobra verde espantada.
Do quarto de dormir.

Quero coalhada feita
De leite deixado a azedar,
Manteiga batida na hora,
Quero o rio pra nadar,
O rio que serve também
Para lavar a vasilha
E restos de arroz são para “pescar”.
A menina com a bacia na cabeça,
A cacimba cheia de piaba,
O sol brilhando no raso do rio,
Eu quero voltar pra lá.

quinta-feira, 25 de setembro de 2008

Big Bang

São tempos...
É o tempo
Inexorável
Deixando marcas
Ao passar

A espera
Ainda infinda
Atormenta
O tempo que resta
Quanto resta?
Quanto até o fim?
Quando o fim virá?
O fio da meada
Esse eu perco
O fio do princípio
Que princípio?
Onde está?
Tempo, morte
Fim e vida
O caos inevitável
De existir-pensar.

domingo, 21 de setembro de 2008

Despedida

Chuva, chuva... Há dias chove, e com raras exceções, os dias são cinzas, quase que em tempo integral. Eu não fico cinza com eles, meu humor, ao contrário, fica melhor. Amo o sol também, tudo tem seu lugar. Contudo, tenho uma quedinha particular pelos ares cinzentos, pelo frio.

Meu canto, uma música boa, um filme, um incenso, o cobertor certo, um livro, a companhia... E o fundo cinza, que a mim só traz intimidade e mais aconchego. São lindos os dias do quase-fim desse inverno.


sexta-feira, 19 de setembro de 2008

sábado, 13 de setembro de 2008

Mais cultura na rua

Buenos Aires, San Telmo
Banda local

Orquesta Típica Imperial

Cultura de Rua

Um pouquinho de tango, em San Telmo, Buenos Aires, no meio da rua. Devíamos ter muito mais dessas manifestações em nossos espaços públicos, pois como lembra Martha Medeiros, arte dá a qualquer dia um ar de feriado. Nós, simples passantes, platéia ávida, merecemos, e os artistas agradecem.

sexta-feira, 12 de setembro de 2008

Inhotim, Brumadinho, MG, Brazil

Mais fotos desse lugar lindo!




Fotos por Tatiana Santana

quarta-feira, 10 de setembro de 2008

Só de sacanagem (Elisa Lucinda)

Meu coração está aos pulos!
Quantas vezes minha esperança será posta à prova?
Por quantas provas terá ela que passar? Tudo isso que está aí no ar, malas, cuecas que voam entupidas de dinheiro, do meu, do nosso dinheiro que reservamos duramente para educar os meninos mais pobres que nós, para cuidar gratuitamente da saúde deles e dos seus pais, esse dinheiro viaja na bagagem da impunidade e eu não posso mais.
Quantas vezes, meu amigo, meu rapaz, minha confiança vai ser posta à prova?
Quantas vezes minha esperança vai esperar no cais?
É certo que tempos difíceis existem para aperfeiçoar o aprendiz, mas não é certo que a mentira dos maus brasileiros venha quebrar no nosso nariz.
Meu coração está no escuro, a luz é simples, regada ao conselho simples de meu pai, minha mãe, minha avó e os justos que os precederam: "Não roubarás", "Devolva o lápis do coleguinha", "Esse apontador não é seu, minha filha". Ao invés disso, tanta coisa nojenta e torpe tenho tido que escutar.
Até habeas corpus preventivo, coisa da qual nunca tinha visto falar e sobre a qual minha pobre lógica ainda insiste: esse é o tipo de benefício que só ao culpado interessará. Pois bem, se mexeram comigo, com a velha e fiel fé do meu povo sofrido, então agora eu vou sacanear: mais honesta ainda vou ficar.
Só de sacanagem! Dirão: "Deixa de ser boba, desde Cabral que aqui todo mundo rouba" e vou dizer: "Não importa, será esse o meu carnaval, vou confiar mais e outra vez. Eu, meu irmão, meu filho e meus amigos, vamos pagar limpo a quem a gente deve e receber limpo do nosso freguês. Com o tempo a gente consegue ser livre, ético e o escambau."
Dirão: "É inútil, todo o mundo aqui é corrupto, desde o primeiro homem que veio de Portugal". Eu direi: Não admito, minha esperança é imortal. Eu repito, ouviram? Imortal! Sei que não dá para mudar o começo mas, se a gente quiser, vai dar para mudar o final!

quinta-feira, 4 de setembro de 2008

De mortes e mais

A morte. Da esperança, da vontade, do desejo, do vital. Caminho para espantar os pensamentos tumultuados em minha cabeça. Não consigo, são teimosos. Então, tento organizá-los, para que ao menos me deixem em paz. Não deixam. Coloco uma música, várias. As felizes não encontram eco. As tristes me doem como nunca e também não quero ouvi-las. Olho o céu, azul, apesar do cinza de dois dias atrás. Não deu na meteorologia, ou se deu não ouvi, mas disse que seria assim.
Pensei que é fácil demais pular, eu que julguei alguém que me disse outro dia da vontade do fim. É fácil, do segundo não porque só ferimentos, alturas maiores. Mas o beija-flor passa, aliás passam dois, e lembro que são anunciadores de boas notícias. Não sei para quem são elas, eu que não recebo nenhuma. Não há o milagre da comunicação, eu não me fiz entender e não entendi os outros.
A morte. O fim. Ele espreita sempre. Ainda sem certeza, já visto o luto, porque sou assim, dramática. Ganhei o direito ao nascer mulher.
A morte da promessa, da felicidade. Ninguém me prometeu nada, nunca discuti esse assunto, e nem sequer sei dizer se é um sonho meu.
Penso na vida que têm as pessoas que passam por mim. Imagino a história e se têm dores. É inevitável. Às vezes não falam delas, mas têm.
1h10. Pensei em 1h30, a cabeça ainda fervilha. Mas quero voltar para o escuro, para onde, dizem, se deve fazer essas coisas. Ainda tenho fome, assim vou resolvê-la antes de me fechar de novo. São 2 meses, são 7 meses, falta uma semana para a entrada no inferno astral, mas desconfio que ele se antecipou. Muita coisa para comemorar. Alea jacta est. E foi. Espero. Que não se demore.
No escuro, uma mão estende-se. Não me dou ao luxo. Pego-a. Uma hora de conforto, escuro de novo. Mas virá o dia novo, com os trabalhadores todos à volta, me expulsam. Passarei o tempo esperando o escuro, onde vivo agora. Não há salvação.

domingo, 31 de agosto de 2008

A caminho

“Depois de todas as tempestades
e naufrágios, o que fica de mim em mim
é cada vez mais essencial e verdadeiro”
Caio Fernando Abreu

Olha:
O agosto
Tão bem-vindo
Já se finda
E abre espaço
Para um setembro
Com mais
Primaveras
Que sempre

As flores
São minhas
Cultivo-as
E então
Posso apreciar
Sua beleza.

Chegue sim!
E traga
As cores
E aqui eu,
Pronta
Para Te receber.

quarta-feira, 27 de agosto de 2008

Sim!

Tudo neste mundo
(Dizia Clarice)
Começou com
Um sim

Assim
Dei licença
E te deixo
Passagem
Só digo:
Bem-vindo!

Meu sim
E teu sim
Juntos
E então, somos.

terça-feira, 26 de agosto de 2008

Fortuna

Na calçada
Uma borboleta
Passa e pousa
Por um segundo
Apenas
Mas é amarela

segunda-feira, 25 de agosto de 2008

Tudo e mais um pouco

Obrigada
Pelo que preciso
E nem me foi dado
E assim mesmo, obrigada

Obrigada
Porque é certo
Ainda que turvo
E já distingo
Teus olhos

Obrigada
Pelo abraço
Que não me falta
Pelo afeto
Que com abundância
Têm sido
Dado a mim

Obrigada
Pelos passos errados
Pelos caminhos truncados
Pelo que pedi e não recebi

Obrigada
Pois que
Apesar de tudo
Portas se abrem
E ainda posso
E, atrevida, canto.

domingo, 24 de agosto de 2008

Um traço

Um passo
Não dado
Define todo
Um porvir

sexta-feira, 22 de agosto de 2008

Bendita Adélia

"Louvado sejas Deus meu Senhor,
porque o meu coração está cortado a lâmina,
mas sorrio ao espelho, ao que,
à revelia de tudo, se promete."

Bendito, Adélia Prado

quarta-feira, 20 de agosto de 2008

Happy Hour

18h30. Desanimadinha, visto que nada nesse mundo se movia, resolveu tomar um espumante e comer queijo brie, não queria saber se combinavam, na boca o gosto lhe agradava, danem-se os experts, eles não estavam em sua cozinha.
Não tinha emprego, logo sem renda, não podia colaborar para o crescimento da economia do país, não podia se endividar pela TV e colchões novos, nem pela mesa de jantar (precisava de algo decente para receber as visitas, não podia receber visitas sem dinheiro), contava agora os centavos da carteira.
Para passar a noite, resolveu que escreveria. Sobre a sensação de pagar impostos numa cidade/estado que não a empregava, droga de roça grande, essa. Não pagaria porcaria nenhuma até conseguir um trabalho decente (só pobre é assim, não gosta de dever, tem que manter o nome, a única coisa que é dele, já rico deve, deve sempre: dinheiro, muito, favores, todos). E o jornal de ontem ainda dizia que os empregos estavam no interior... Mais essa agora.
Então que a pessoa se esfola para trabalhar/estudar/morar só/sustentar-se, tudo isso aos 21 anos, ganhando algo como dois salários mínimos. Consegue, nem sabe como, mas consegue (isso é que deveria aparecer em “Vídeos incríveis”, sua vida, a de vários, filmada).
Não contente, ela quis ser Alguém. Brigou por uma promoção, cresceu, ficou grande demais onde estava, e precisava de um lugar maior. Foi atrás, e conseguiu de novo, com ela era assim, as coisas aconteciam, e se não, ela fazia acontecer. Chegou Lá, um lugar que já era o Maior do mundo, e não bastasse o Lugar ainda tinha a missão de ser o Melhor do Mundo, assim com maiúscula, todos os continentes. E lá também ela cresceu, contaminou-se com as visões, missões, virou Alguém ainda maior, Alguém gerente, salário bacana, resultados bacanas, dinheirinho no bolso. E enfim, era Alguém, mas Alguém de saco bem cheio de tanta falação, e ralação, e dinheiro nem tão bom assim, pensando bem. E então, virou alguém sem emprego. E agora vai dormir, porque acabou de tomar um leite quente com chocolate, e amanhã precisa continuar a busca, precisa voltar a ser Alguém.

Todas as noites, na minha janela

"Lua,

Espada nua

Bóia no céu imensa e amarela

Tão redonda a lua

Como flutua

Vem navegando o azul do firmamento"




Luiza, Tom Jobim
Foto em 16.08.2008, TX

sábado, 16 de agosto de 2008

Para limpar a casa-alma


Então, Pessoa. Pasmo!
Olho ao meu redor, tudo limpo:
Cozinha, banheiro lavado,
Chão brilhando, camas arrumadas,
Quase tudo em seu lugar.
E meu corpo moído.
Porque é assim, aqui nessas paragens.
Eu, que às vezes me finjo poeta,
Também às vezes
Preciso fazer a faxina.
Sou Amélia, sou Adélia.

Em ambos os casos,
Sou eu seguindo meu destino,
Cuidando minhas rosas,
Meus mundos.

quarta-feira, 13 de agosto de 2008

Randômico


No princípio,
Gosto comum
Afinidades assim
Estreitavam laços,
Sentiam-se quase um,
Recompensa pelos sós
Tanto tempo antes.
Então divergências,
Nada de mais,
Uma cor que ao outro
Não agradava tanto.

E daí?
Agora sei que de você
Quero mais que afinidades.
Diferenças fascinam,
O novo me inquieta,
Só olhos curiosos
Mantêm mentes abertas.
E sim, arestas me interessam.

Eu sou a falta

O abandono, Camille Claudel


Uma madrugada. Princípio ainda. Eu me sentia muito estranho. Não era triste, triste. Mas algo assim, melancólico. Talvez esse sentimento incomode você, dito assim. Fazer o quê? Era como eu me sentia.
Podia fumar, mas “parei” há mais de um mês. Andar, a essa hora, em cidade grande, e sozinho, não é coisa recomendável. Beber? Metade da graça era o cigarro de acompanhante (volte ao início). Então restava contar pra você dessa melancolia triste de início de madrugada, e desafogar um pouco, quem sabe, esse coração.
Nem era melodrama: com amor, com casa, com família, sem mesmo era trabalho, mas que isso era pouco diante dos problemas de alguns. O olho, o coração, o corpo todo é assim: só sabe do que não tem. E o não ter grita, impõe sua não presença em todos os cantos: pensamentos, sentimentos, conversas, solilóquios. Não ter só sabe existir grande, exagerado, não ter é uma perua recém-saída das compras na 25 de março, e veste laranja, verde limão, usa saldo, cabelão, lantejoulas, batom vermelho, tudo ao mesmo tempo. Não tem como não ver. O não ter não sabe ser leve, não pisa macio, finca sim o salto no chão que pisa, e faz barulho.
Uma madrugada assim, idiota. Nem vontade de chorar. Nada consola, não há o que consolar. E você, conta aí: o que te dói, o que te consola? Qual é o seu não ter?


(Para Caio F., depois de ler “Pálpebras de Neblina”)

Cada um à sua maneira



“Segure seu humor. Seguro o meu, mesmo dark: vou dormir profundamente e
sonhar com uma linda e fatal jamanta. A mil por hora.”
Caio Fernando Abreu




Ando relendo Caio Fernando Abreu, Pequenas Epifanias, com crônicas publicadas entre 1986 e 1995. Relendo é modo de dizer, já que o tenho sempre à mão, consulto como um manual, amo com paixão seus escritos.
“Deus é Naja” me chamou a atenção, e vale à pena ler, como tudo de Caio. É sobre manter o humor em tempos difíceis. A maré não anda pra peixe. Todos, eu disse todos, têm problemas. Variam os tamanhos e conseqüências, mas cada um sabe como, e onde, doem os seus.
De mim, sei dizer que escolhi uma forma de encarar, e ela inclui o bom humor. Não digo que não sofro, e mais: em momento drama-mexicano, consigo imaginar o poço mais fundo, fétido e podre, e eu no fundo mais fundo dele, coberta até a cabeça de estrume. Minha imaginação faz inveja.
Quando mais lúcida, consigo rir dos meus problemas, mesmo quando mais sérios. Como diz Caio, nessas horas busco o ponto onde o trágico perde o sentido, podendo até ficar meio cômico, só assim para agüentar quando dói demais. É certo que nem tudo se leva leve desse jeito, cada um com seu limite.
Não receito nada a ninguém, não sou médico e vocação para terapeuta, tenho zero. Muito mais ou menos, ando dando conta de mim. Escrevi aqui só mais um jeito de pensar. E penso que quando nada mais servir, vou contar uma piada besta, gargalhar, só não vou sonhar com minha jamanta própria.

terça-feira, 12 de agosto de 2008

Impublicável

Tanta leitura tinha que servir para alguma coisa. Nem que fosse pra escrever uns textinhos medíocres, e publicar na internet, ainda que ninguém fosse ler. Ai, internet e seus blogs. Agora, todo mundo pensa que é escritor.

Que mentezinha essa sua hein? Então, cadê a democratização que vive em você? Por acaso, escrever é para abençoados? Coisa de iniciado, círculos fechados e afins? Deixa de ser bobo, que falar da vida é para qualquer um, para mortais, para comuns. Porque eles sabem mais que acadêmicos, estudados, e sabem mais que gente que tem muita técnica, mas da vida pode dizer pouco. Escrever é para qualquer um que sente, independe de escolaridade, dinheiro, status, classe social. Porque da vida sabem todos aqueles que vivem.

segunda-feira, 11 de agosto de 2008

Ócio e ofício

“I don't care if monday's blue
Tuesday's grey and wednesday too
Thursday I don't care about you
It's friday I'm in love”
The Cure


Tenho descoberto umas alegrias diferentes com a idade. Das últimas, a que mais me chama a atenção, a que mais gosto é a alegria das sextas-feiras... Até dei de presente a elas uma música, e para me ver feliz, basta cantarolar.

Se é segunda, terça, pouco importa. Desde que lembrada, a danadinha da música me traz a sexta feliz à cabeça. Nem precisa ser AQUELA sexta, que antecipa um fim de semana fenomenal. Pode ser a sextinha de sempre, o que aliás tenho preferido. Não precisa festa de arromba, encontros sensacionais, programas incríveis, viagens internacionais, nem sítio, nem cachoeira, nem mesmo sol é necessário. Veja bem: pode ter, mas não PRECISA. Bastam a companhia de quem quero muito, uns poucos e bons filmes, um bom edredom (até sem inverno eu topo), e um descompromisso total com horários e agenda e, tenho certeza, terei o fim de semana perfeito.

Deve ser reflexo, penso eu, do excesso de obrigações que temos: chegar ao trabalho sem atraso, almoçar cronometrando os segundos entre congestionamento de carros nas ruas e pessoas nos restaurantes, não esquecer de pagar o condomínio, aproveitar a liquidação de inverno, fazer as unhas, molhar as plantas, batizado do filho da prima, casamento da filha do vizinho da vó, aiiiii! Com tanta agenda, a sexta-feira vira alvará de soltura, carta de alforria, ainda que temporária, portas abertas para um sábado e domingo de pura preguiça e falta do que fazer.

“Eu quero uma licença de dormir, perdão para descansar horas a fio”, dizia Adélia Prado. Eu também preciso dessa licença para o nada, bendito o ócio nosso de toda semana.

Inhotim, Brumadinho, MG, Brazil









Eu em Inhotim, programa imperdível para quem vive em BH. Não deixe de conhecer!

Além de jardins incríveis, projetados em conjunto com Burle Marx, Inhotim tem um acervo artístico lindo, de encher os olhos até de leigos em arte, como eu. Para ver antes, http://www.inhotim.org.br/

A fé no outro


“Correr com lágrimas nos olhos
não é definitivamente
para qualquer um”
Lobão


Foi recebida com braços semi-abertos. Não sem razão, em tempos em que, infelizmente, não se podia confiar tanto assim. Não que houvesse rudeza no trato, isso não. Havia, claro, a educação, mas se percebia a distância, uma certa “desconfiança”, mineiro é assim, diriam. Mas não deu bola para isso, seguiu abrindo caminho aos poucos, sem ninguém perceber, nem ela mesma.

As presenças necessárias, as festas, o social, foram suas entradas naquele mundo. As conversas, a princípio, tímidas, mas não se poupava, e tratou logo de ser ela mesma, falando a esmo, vencida a barreira primeira da timidez. Ora, ora. Não parecia, mas era tímida. Aquele ser meio “bicho do mato”, e que uma vez sem vergonha, falava de tudo: do que entendia, daquilo que não sabia e até dava palpites sem ser chamada, e quando chamada também. Aí descobriram gostos parecidos, diferenças, se apresentaram novas cores, sons, músicas. Aproximaram-se lentamente, como são os inícios de grandes amizades, grandes parcerias. Ao que parece, perceberam que algo comum os unia, e isso os faria dividir uma vida também em comum, e entenderam-se bem.

E então, em um dia que não se lembra bem qual (é certo que algo se comemorava) encontraram-se para almoçar e celebrar. Naquele dia, depois de satisfeitos todos à mesa, ela percebeu que fazia parte do grupo. Nem havia demorado tanto tempo assim, e os braços se abriram, fortes, largos, num abraço em que ela coube sem folga, na medida exata de sua necessidade e da deles. Um abraço de onde (isso sabia) não sairia nunca mais.

Excessos

Nada era ponderado, comedido. Se tinha nojo, era pra vomitar. Na raiva, um acesso. Na preguiça, enrolava-se de não fazer um movimento. Que coisa isso de ser inteira! Queria, às vezes, ser pela metade, talvez desse menos trabalho. Nesses dias, então, quando cismou de ser infeliz, estava miserável. Não conseguia ver a metade cheia, era a metade vazia que lhe gritava, berrava a ausência. O corpo doía de nada, o cansaço invadia, e sem motivos, apenas, caprichoso, ficava, estendia sua permanência ao limite do insuportável. Não havia (quase) salvação.
O limite. Quase chegando. O medo era de não haver mesmo a salvação. No fundo, guardava aquela certeza, quase lucidez, da saída próxima. Mas agora até disso duvidava.

Rascunho

Não estava a fim de nada, estava a fim de tudo. Sentada, deitada melhor dizendo, ela olhou mais uma vez a TV, onde não se via nada. Pensou em dar uma volta no shopping, dois minutos, toca o telefone. “Vamos ao shopping? Preciso comprar umas coisinhas aqui, ali, logo a gente se vê e põe em dia”. Não quis. Ficava em casa mesmo. Vinha um desânimo, uma tristeza tão grande hoje, que teve pena de si mesma e tentou chorar. Lágrimas de 2 segundos.

Shopping? Ela que adorava uma prestação, cartões com crédito absurdos, e uma vontade maior ainda de gastar para tapar o buraco. Ia fazer o que lá se não podia usá-los? Não tinha o dom da abstração, gostava mesmo era do palpável. Tudo bem, superficial isso, mas a vida tem dessas coisas, tudo se mistura em algum momento. Continuou num sentar-deitar de quase fazer dó.

Mais meia hora de nada na TV, outro telefonema. Agora a irmã: já tomou a vacina? Não, não tomou, aliás nem lembrou. E aí até se animou, animou a irmã para já encarar a fila, pôs uma roupa qualquer e desceu. Nem trinta minutos e tudo resolvido. Saiu com a irmã, pegou a mãe no caminho, deixou-as em casa. Na volta, passou na padaria, pão, leite, café, o trivial. Padaria cheia, todo mundo envolvido com o café da tarde, vida classe-média tarde-de-folga-sábado-normal. E nela, voltou uma sensação de calma, tudo estava como tinha que ser. Quando as coisas iam ser mesmo normais?

quinta-feira, 7 de agosto de 2008

Eu

Auto-retrato, era digital, Londres, 04.2007, muito fria

Eu, quando percebo, estarreço-me
Não sendo Fernando Pessoa, não pasmo
Dificilmente desolo-me
Mas começo e acabo coisas, sim
Embora sejam caóticos
Os pensamentos todos
Que ando pensando
Encanto-me
E encanto
Quem se deixa levar
Falo sem ciência
E no entanto
Minha fala tem paixão
A paixão que consome
A paixão de quem
Quer da vida
As Cinzas dignas de Caio
Muito mais que
Matérias intactas

quarta-feira, 6 de agosto de 2008

Para recordar, um avô


Não era um avô convencional. Aliás, hoje existe família convencional? A começar pelo fato de não viver na mesma casa que a avó. Eram separados, e suas casas ficavam a menos de 100 metros uma da outra, e assim levavam a vida quase que do mesmo jeito. Ele aparecia para o café da manhã, almoço e janta (que é como se diz no interior), infalível e diariamente. Os cafés ao longo do dia, e eram muitos, também eram todos na casa dela. E ela, a vó, implicava com ele, implicava com a “bagunça dessas meninas”, implicava com tudo.

Dele, a menina lembra da Brasília azul, e muito antes dessa, havia também os jipes, um azul, outro verde, e todos os primos (uns 5?) mais a família quase toda enfurnada neles, cortando sertão para chegar na roça. Saudade da roça! Mas essa fica pra outra vez.

O vô ficava na porta da casa, e isso era praticamente como estar na rua, visto que as casas do interior são assim, sem portão, sem jardim, e as janelas e portas se abrem diretamente para as calçadas. Ao fundo, e bem alto, tocavam uns discos de tango ou bolero, ela não sabia dizer, era uma criança. Mas as músicas eram melosas, cantadas quase sempre por alguém com uma voz grossa, e as letras de amores. Ela se lembra, como hoje, dele parado na porta, com as mãos no bolso, sempre arrumado, fazia chuva ou sol, estava ele com a calça e a camisa social. E nos pés, nada de sapatos (será que era dele que havia “herdado” a mania?). No bolso de trás da calça, um pente antigo, desses que não se acha mais, com uma alça onde se punha a mão e já saía com o danado no ponto de uso: passava o pente na cabeça, ajeitando o cabelo quase raspado, sempre vaidoso o avô.

Fumava cigarro de palha, e gastava tempo cortando o fumo de rolo com o canivete, picotando até ficar bem esfarinhado, aí pegava a palha, abria, jogava o fumo, enrolava a palhinha e passava a língua para selar. O ritual terminava com o cigarro sendo aceso, com fósforo é claro, e as batidinhas com a caixa (para manter a brasa) até o fim das tragadas. A cena era nítida na memória da menina.

Ela não teve o privilégio da convivência diária com o avô, eram netos criados na cidade grande. Só se viam nas férias, quando ele recebia as meninas sempre com um comentário brincalhão, “Uai, quem são vocês que eu não conheço mais?”, se referindo ao fato delas terem crescido, e por aí ia.

O tempo passou, e cumprindo sua sina?, o avô se foi. A morte dele, é claro, deixou a neta triste. Mesmo assim, a menina nunca conseguiu recordar-se do avô com tristeza, e apesar de tantos anos de ausência, ela sempre o lembra com alegria imensa, ainda vê nele uma figura protetora, brincalhona. Ele foi e sempre será o avô das gracinhas, das risadas abafadas enquanto a avó implicava, o avô que trazia picolé de creme de ovos do bar, o avô que esperava por elas na porta quando chegavam as férias, sempre com um sorriso no rosto. Que chamava de “cu d’água” as meninas quando faziam xixi na cama. Ele era aquele que, quando a vó implicava e xingava porque os netos tinham comido todo o pão e biscoito da mesa, na maior falta de educação, dizia alto: “Deixa os meninos, Calú”.



terça-feira, 5 de agosto de 2008

Mensageiro


Choveu...
E daí que só por isso
Agosto se fez diferente,
E desanuviou a paisagem
Cinzenta
Dos dias de umidade baixa.

A planta, agora úmida
Agradecida
Planeja ganhar viço,
E a esperança
Em mim, também
É assim:
Viceja por muito
Pouco
Ou até mesmo
Quase nada

Dolce vita - paradoxo do tempo


Aí aconteceu o esperado: ela perdeu o emprego. Perdeu é modo de dizer, porque lembrou-se de como já estava infeliz ali, de como passava os dias contando as horas e minutos e segundos para ir embora. E passava as semanas contando quantos dias faltavam para a sexta. E contando quantos meses faltavam para as próximas férias ou feriado prolongado. Uma agonia, aquilo. Mas precisava pagar as contas e, acomodada, foi ficando por ali mesmo, infeliz da vida.

Ela se conhecia, e sabia que aquilo não poderia durar, já que não agüentava viver assim, com hora marcada pra ser meio triste. E convenhamos: bater ponto na tristeza é muito, mesmo para o mais conformado dos viventes.

Percebeu uma estranheza no ar bem antes do ocorrido, dada que era a uns surtos de premonição. Não sabia bem o quê, nem como, nem por quê, mas cantou a pedra meses antes do fato, e já anunciava aos mais íntimos que isso poderia acontecer, mais cedo ou mais tarde. Ba-ta-ta!! Como diria a avó. Pensou um pouco: é certo também que de alguma maneira buscara aquilo, e ela sabia. Não escondia sua insatisfação ali dentro, e só faltava verbalizar. Não, nem isso faltou.

Viu-se então diante do incerto, e pela primeira vez em quinze anos (com exceção das férias) não tinha que levantar cedo e sair correndo para o trabalho. A falta do que fazer não era um problema, já que ela cultivava prazeres os mais variados, não vivia só para o trabalho, tinha uma vida pessoal quase plena (era humana) e satisfatória, a despeito das tentativas diárias das corporações de sugar seu sangue e alma para o trabalho. Sua crença, essa foi mantida intacta: acreditava no trabalho como meio de vida, e não pavimento para a morte. Mortes variadas: a literal, do corpo, a morte da alma, das brincadeiras com os filhos, morte da leitura, de ouvir boa música, de ter tempo para os amigos, do tempo de pegar um cinema com a irmã e até mesmo do tempo para ficar sem pensar em nada, morte do tempo de viver para ser feliz.

Tratou de continuar vivendo, foi buscar outras chances, pensando se era mesmo aquilo que queria. Releu livros, descobriu outras músicas, dormiu de tarde, viu filmes de madrugada, namorou sem ter hora de acabar, cozinhou, arrumou a casa, construiu novos afetos, limpou a estante, vai até doar alguns livros (e mais alguns, se conseguir se desapegar), fez fotos bacanas, está aprendendo a curtir pintura, fez o que tinha e não tinha direito.

Continua desempregada, não à toa, vejam bem. Disseram que seu currículo é “muito bom”, e sua recolocação no “mercado de trabalho” está suada. Nem se assustou com o diagnóstico da moça da empresa de headhunters, a mediocridade da vida inunda tudo. Ela precisa pagar as contas, e segue buscando, sem saber muito o que quer, tem seus dias de descrença, até uma certa “revolta” pinta, mas sabe que vai acontecer. Ah: ela está nesse momento descobrindo a música clássica, aprendendo a viver sem culpa, e parece que anda escrevendo uns textos, e achou alguns até bem legais.

O poetinha na madrugada

Redondilhas para Tati

Sem ti vivo triste e só
(Bastasse o que já sofri... )
Sem ti sou ermo, sou pó
Sou tristeza por aí...
Sem ti... ah, dizer-te a ti!
Mas se me cerra o gogó
Como se tivesse aqui
Um naco de pão-de-ló!
Sem ti sou pena de Jó
Sou ovo de juriti
Sem ti sou carandaí
Tamandaré, Mossoró
Sem ti sou um qüiproquó
Um oh, um charivari
Sem ti, sou de fazer dó
Sou de fazer dó-ré-mi
Meu benzinho de totó
Meu amor de tatuí.
Mas sou forte não reclamo
Sou bravo como Peri
– Não, mulher, já não te amo!
(É brincadeira, hem, Tati... )
Tati, Tatuca, Tatica
Onde ficou minha tática
Perdi toda a velha prática...
Esta vida é uma titica.
Ah, garota, francamente
Nem sei mais o que pensar
És tu que estás tão presente
Ou eu que fui me casar?
Não posso, Tati, te juro
Não posso viver sem ti
Tu és meu cantinho escuro
Meu verso por descobrir
És meu eterno oxalá
Em terra de alibibi
És meu trecho de Zola
Repassado por Delly
És Totonha, Tatiana
Tereza, e nunca Tati
És extrato de lavanda
Rotulado por Coty
Beatriz?... mas quem és tu
Para Dante abandonar?
Sereis um merci bocu
De praga de pai Exu
Para cima de moá?

Não! Tu és como o penedo
E eu... como a onda do mar
És a sombra do arvoredo
E eu... pastor a descansar
Sou o ouvido, és o segredo
És a luta, eu sou a paz
És Beatriz Azevedo
E eu Vinicius de Moraes.

(Vinícius de Moraes)

Saudação


Agosto começou em plena sexta, dia que adoro, nem sei o motivo. Ou melhor, imagino, começo a ficar feliz na quinta. O sol ajuda a deixar o dia lindo, apesar da secura incomum, e no caso da minha vizinhança, agravada por construções infindas, que só fazem nascer pó do chão dos apartamentos. Quem limpa?

Eu? Entrei só para te dar as boas vindas.

quinta-feira, 31 de julho de 2008

Para memória fraca, use a lista

Não exatamente preocupada, mas atenta às coisas da casa, estou aqui listando o que falta para a compra do supermercado. E me dei conta de como adoro uma lista. Não sou apegada a datas, logo minhas listas são feitas em qualquer época, não dependo de um ano novo para elas. Acho que até ritual para escrever eu tenho. Essa do supermercado, por exemplo: começa dias antes da tal compra, não é feita de rompante, mas calma e meticulosamente. O bloco e a caneta ficam à mão, pois na hora mais imprópria percebo: falta sabonete. Anota. Lendo um livro, ouvindo uma música, o dia passa, chega a noite, e eu adoro uma vela. Mas acabou, e adivinha: lista nela! E assim vai, dias se seguem, e o rol do supermercado vai ganhando em tamanho, pensado quase como uma obra de arte.
Nesse ano me mudei, e com a mudança, veio a necessidade de outra lista: livros. Os que tenho, obviamente. Opa! Posso fazer também a dos que quero ler e ter, nessa eu não tinha pensado... Bom, voltando aos livros: comecei toda feliz uma planilha, tirando um a um da estante, catalogando nome e autor, antes de encaixotar. A tarefa, braçal diga-se de passagem, era feita de noite, depois de um dia inteiro de trabalho, e fato é que na altura do 150º livro, perdi a paciência e deixei de lado. Está aqui, salva e intacta, esperando a finalização (virá?).
Tem outra que adoro: as coisas que ainda quero para deixar minha casa do jeitinho que imagino, gostosa e aconchegante. E isso dá trabalho e gasto, muito gasto, então por ora fica só a lista mesmo. Almofadas (lisas ou estampadas?), fotos para ampliar e colocar nas paredes, aquele banquinho para acomodar a pipoca e a coca cola enquanto vejo filmes, a samambaia e a lanterna que quero para a varanda, e por aí vai.
Ontem comecei outra: a dos filmes que vi. Consegui me lembrar de poucos, eu que assisto e gosto de tantos. Escrevendo os nomes, fui pensando também naqueles que quero rever. Outra lista, pode?

Mais:
Músicas que quero ouvir;
Cantores cujo trabalho quero conhecer;
Passeios que ainda quero fazer;
Cidades que visitei;
Cidades e lugares que ainda quero conhecer;
Blogs que quero visitar;
Comidas que quero experimentar...

Algumas dessas já tenho, outras inventei agora. Comecei esse texto pensando nas minhas listas de um jeito engraçado, vendo-as como uma mania boba, meio neurótica. E agora, vejo que tem um lado legal: elas fazem lembrar e resgatar histórias e épocas da minha vida, felizes, despreocupadas, intensas, chorosas, e todas com um traço comum: me fazem ver o quanto vivi, e bem. Cada filme, livro, desejo, colocados no papel, trazem os cheiros, sensações, sabores de outros tempos, e ter essas memórias despertadas é bom, simples e bom. Aposto que isso pode render outra lista...

quarta-feira, 30 de julho de 2008

Trégua

Chega. Decidi que vou dar um tempo de pensar nos problemas. Tem hora que simplesmente não dá mais: se continuar com isso, vou ficar maluca. Um, porque chega um ponto em que se fica impotente diante da situação. Dois, porque a minha cabeça dói. Mas lá no fundo a mente, teimosa e independente, insiste em deixar claras suas opiniões: “você não pode esperar”, “é loucura deixar pra depois”, “arrume um jeito, pense em uma saída”. Ah, a maldita culpa.

Fato é que deixarei de lado, ao menos por hoje, esses chatinhos, os problemas. Até porque, quando se pensa demais neles, tendemos a superdimensionar os danados. Acho que “afastar-me” vai proporcionar a distância necessária para que eles fiquem do tamanho que têm que ser. Ah, caprichosos esses bichinhos...
Eu posso ser mais ainda...

Gorjeio


Hoje eu acordei:
Com vontade de cantar
Um passarinho
Que é
Feliz
Porque canta

Se me perguntam
De onde
Ela vem
Não entendem
Nada
Do que falei

Ela vem de mim
Sem explicação
Como quase tudo
Que se vê por aí

Tenho em mim...
Sempre
Os sentimentos
E um mundo

domingo, 27 de julho de 2008

Saudade do que não vivi?


Então, relendo antigas revistas, achei uma matéria interessante, sobre como não vivemos o tempo presente. Influenciada pelo título, decidi, só por aquele momento, ler com calma e atenção o tal texto. Foi inevitável a identificação com os casos de corre-corre narrados na reportagem. E é verdade. Transformamo-nos em reis do faz-tudo-ao-mesmo-tempo-agora. Agendas cheias, coração vazio?

Lendo o texto, pensei em como passamos grande parte do presente preocupados ora com o que passou, ora com o que queremos que aconteça (ou que inevitavelmente vai acontecer). Mas viver mesmo, ali na hora, nada.

E pensei também que a vida dá a oportunidade de tentar mudar isso. Tentei então, por iniciativa própria, prestar atenção somente naquelas páginas de revista, naquele momento. Sem internet, sem MSN e plocs na tela do computador, sem música, televisão desligada, com a atenção toda voltada para aqueles poucos minutos. Prestei atenção na minha respiração... Inspira, solta, lenta, como quem tem todo o tempo do mundo, ainda que fossem meros 10 minutos de calmaria.

E não é que ao final da reportagem, eu me sentia menos ansiosa? A minha percepção, é claro, foi alterada. Meus ouvidos captaram o silêncio do cair da tarde (isso é possível mesmo em cidades grandes!), minha palpitação constante se acalmou (ainda que voltasse ao “normal” depois), e senti até um certo sono, eu vítima de insônias inúmeras vezes...

É claro que não durou muito o momento zen, afinal, como a maior parte das pessoas, eu sou ótima dando conselhos, e péssima para aplicá-los à minha vida, e raramente dou continuidade aos planos de viver melhor, mas vale a pena pensar um pouquinho. Sigo com a cabeça tumultuada por problemas que não posso resolver agora, enquanto ao meu lado estão aqueles que amo, em quem penso e sinto saudade quando estão longe... Êta gente besta, Meu Deus.

sexta-feira, 25 de julho de 2008

Mis colores


Era assim:
Azuis imensos, brilhantes
Vermelhos, berrantes, de brasa
Amarelos de ouro.

Os traços incertos,
Até mesmo infantis
Diziam dele tudo?
(Diziam...)

Parecia sem sentido
E, no entanto,
Era felicidade
Vida que despertava.

Sua alma de artista
Ao cabo de tudo sabia:
Só fazia sentido
Quando alguém
Encontrava.

Prescrição


Convite


Basta de poemas para depois...

Ó Vida, e se nós dois

Vivêssemos juntos?

in Báu de Espantos, Mário Quintana

Outra dose


A arte do chá

ainda ontem
convidei um amigo
para ficar em silêncio
comigo

ele veio
meio a esmo
praticamente não disse nada
e ficou por isso mesmo

(Leminski )
________________________________________
"Mundo mundo vasto mundo,
se eu me chamasse Raimundo
seria uma rima, não seria uma solução.
Mundo mundo vasto mundo,
mais vasto é o meu coração.
Eu não devia te dizer
mas essa lua
mas esse conhaque
botam a gente comovido como o diabo."
in Poema de Sete Faces, Carlos Drummond de Andrade

Drágeas


"Eu gosto de fazer poemas de um único verso.
Até mesmo de uma única palavra

Como quando escrevo o teu nome no meio da página
E fico pensando mais ou menos em ti

Porque penso, também, em tantas coisas... em ninhos
Não sei por que vazios em meio de uma estrada

Deserta..."


Conversa Fiada, Mário Quintana






A oração de Clarice


"Não, não devia pedir mais vida. Por enquanto era perigoso. Ajoelhou-se trêmula junto da cama pois era assim que se rezava e disse baixo, severo, triste, gaguejando sua prece com um pouco de pudor: alivia a minha alma, faze com que eu sinta que Tua mão está dada à minha, faze com que eu sinta que a morte não existe porque na verdade já estamos na eternidade, faze com que eu sinta que amar não é morrer, que a entrega de si mesmo não significa a morte, faze com que eu sinta uma alegria modesta e diária, faze com que eu não Te indague demais, porque a resposta seria tão misteriosa quanto a pergunta, faze com que eu me lembre de que também não há explicação porque um filho quer o beijo de sua mãe e no entanto ele quer e no entanto o beijo é perfeito, faze com que eu receba o mundo sem receio, pois para esse mundo incompreensível eu fui criada e eu mesma tambem incompreensível, então é que há uma conexão entre esse mistério do mundo e o nosso, mas essa conexão não é clara para nós enquanto quisermos entendê-la, abençoa-me para que eu viva com alegria o pão que eu como, o sono que durmo, faze com que eu tenha caridade por mim mesma pois senão não poderei sentir que Deus me amou, faze com que eu perca o pudor de desejar que na hora de minha morte haja uma mão humana amada para apertar a minha, amém.


Não era à toa que ela entendia os que buscavam caminho. Como buscava arduamente o seu! E como hoje buscava com sofreguidão e aspereza o seu melhor modo de ser, o seu atalho, já que não ousava mais falar em caminho. Agarrava-se ferozmente à procura de um modo de andar, de um passo certo. Mas o atalho com sombras refrescantes e reflexo de luz entre as árvores, o atalho onde ela fosse finalmente ela, isso só em certo momento indeterminado da prece ela sentira. Mas também sabia de uma coisa: quando estivesse mais pronta, passaria de si para os outros, o seu caminho era os outros. Quando pudesse sentir plenamente o outro estaria salvo e pensaria: eis o meu porto de chegada. Mas antes precisaria tocar em si própria, antes precisava tocar o mundo."

In Uma Aprendizagem ou O Livro dos Prazeres, Clarice Lispector

quarta-feira, 23 de julho de 2008

Uma flor, meu bebê


Há dias espero a flor no jardim.
Não sei a cor, nem o cheiro, nem a forma.
Adivinho? Ou a sei bela antes de conhecer?
Ela que já me veio em sonho...

Nem é época de flor, podem dizer alguns
E eu só posso concordar,
Mas quem precisa época certa para sonhar?

Sigo buscando-a todas as manhãs,
A despeito do inverno frio que faz por aí.
Alimento meu desejo não secreto
De vê-la antes da primavera.
Enquanto espero, sigo sonhando.


TSM, 23.07.2008

Por que você faz?


Poesia não tem nexo,
Poesia não tem sexo,
Poesia não está prosa.

É para curtir solidão,
Choro, melancolia.
Às vezes fala até de alegria,
Mas Poesia fala do que quiser,
Pois Poesia fala de alma.

Poesia manifesta, comemora,
Celebra, também chora.
Poesia sussurra, quase sempre grita.

Poesia cabe num verso,
Poesia cabe numa nota.
Poesia que atravessa o meu dia.

TSM, 23.07.2008


“Qualquer coisa é a casa da poesia”

Adélia Prado

sábado, 19 de julho de 2008

sexta-feira, 18 de julho de 2008

Oração

São quase 3 horas da manhã... de uma quinta-feira que nada anuncia de novo. De repente me dou conta de que não sou, não tenho nada... (Como ter esperanças?)


Meu único compromisso é o de manter em dia a agenda de futilidades. Cansei de procurar por isso que não aparece de jeito nenhum, chego a pensar se existirá. Já ouvi que, se pedir, receberei. Pedi, pedi, pedi de novo: N A D A. E mais, acho que em casos como esse nem se precisava pedir, mas vá lá, sigamos pedindo.
E sabe o pior: nem é desespero. É só a constatação de que tudo parece estar parado, um lago de tranqüilas águas, e eu aqui, um turbilhão. Não tem equilíbrio que se segure. Estão ou não acontecendo? Porque a impressão, agora, é que tudo está no mesmo lugar de sempre. Quase: menos eu.


TSM, 17.07.2008

Revisitando Caio Fernando Abreu, achei 2 contos que amei reler: “Pequeno Monstro” e “Os Dragões não conhecem o paraíso” (in “Os Dragões não conhecem o paraíso”). Abaixo, um trecho do segundo texto:

“Então, que seja doce. Repito todas as manhãs, ao abrir as janelas para deixar entrar o sol ou o cinza dos dias, bem assim: que seja doce. Quando há sol e esse sol bate na minha cara amassada do sono ou da insônia, contemplando as partículas de poeira soltas no ar, feito um pequeno universo; repito sete vezes para dar sorte: que seja doce, que seja doce, que seja doce, que seja doce, que seja doce, que seja doce, que seja doce e assim por diante. Mas, se alguém me perguntasse o que deverá ser doce, talvez não saiba responder. Tudo é tão vago como se fosse nada”

E um trecho de um conto sem título, in Caio 3D, O Essencial de Década de 1980

"Vai passar, tu sabes que vai passar. Talvez não amanhã, mas dentro de uma semana, um mês ou dois, quem sabe? O verão está ai, haverá sol quase todos os dias, e sempre resta essa coisa chamada "impulso vital". Pois esse impulso às vezes cruel, porque não permite que nenhuma dor insista por muito tempo, te empurrará quem sabe para o sol, para o mar, para uma nova estrada qualquer e, de repente, no meio de uma frase ou de um movimento te surpreenderás pensando algo como " estou contente outra vez". Ou simplesmente "continuo", porque já não temos mais idade para, dramaticamente, usarmos palavras grandiloqüentes como "sempre" ou "nunca". Ninguém sabe como, mas aos poucos fomos aprendendo sobre a continuidade da vida, das pessoas e das coisas. Já não tentamos o suicídio nem cometemos gestos tresloucados. Alguns, sim - nós, não. Contidamente, continuamos. E substituímos expressões fatais como "não resistirei" por outras mais mansas, como "sei que vai passar". Esse o nosso jeito de continuar, o mais eficiente e também o mais cômodo, porque não implica em decisões, apenas em paciência. Claro que no começo não terás sono ou dormirás demais. Fumarás muito, também, e talvez até mesmo te permitas tomar alguns desses comprimidos para disfarçar a dor. Claro que no começo, pouco depois de acordar, olhando à tua volta a paisagem de todo dia, sentirás atravessada não sabes se na garganta ou no peito ou na mente - e não importa - essa coisa que chamarás com cuidado, de "uma ausência". E haverá momentos em que esse osso duro se transformará numa espécie de coroa de arame farpado sobre tua cabeça, em garras, ratoeira e tenazes no teu coração. Atravessarás o dia fazendo coisas como tirar a poeira de livros antigos e velhos discos, como se não houvesse nada mais importante a fazer. E caminharás devagar pela casa, molhando as plantas e abrindo janelas para que sopre esse vento que deve levar embora memórias e cansaços. Contarás nos dedos os dias que faltam para que termine o ano, não são muitos, pensarás com alívio. E morbidamente talvez enumeres todas as vezes que a loucura, a morte, a fome, a doença, a violência e o desespero roçaram teus ombros e os de teus amigos. Serão tantas que desistirás de contar. Então fingirás - aplicadamente, fingirás acreditar que no próximo ano tudo será diferente, que as coisas sempre se renovam. Embora saibas que há perdas realmente irreparáveis e que um braço amputado jamais se reconstituirá sozinho. Achando graça, pensarás com inveja na lagartixa, regenerando sua própria cauda cortada. Mas no espelho cru, os teus olhos já não acham graça."


Caio Fernando Abreu



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